sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Diário

   Tenho andado de coração mais leve, de cabeça vazia. Os anos vieram e não me sinto, ainda, mais sábio, mais preparado ou mais perto do fim dessa jornada - não de vida, mas de conquistas. Parece que hoje, como há dez anos atrás, estou a ter que inciar ainda muitos estudos e viagens, mas me pego infantil e tolo, fazendo piadas para que ela sorria ou escrevendo por sobre as margens para transgredir mais uma norma.
   Temo pela saúde e pelo sustento de minha mãe, pelo amor de meu pai. Em meio a eles, tudo o que restou foi esse trapo a quem chamam: "meu filho". Sujeito imaturo e fracassado, dado à música e à escrita, sem feitos, frutos ou graduações.
   Seu irmão, homem forte e feito que é, lhe faz lembrar a todo instante em que tipo está se tornando. Mesmo com todos os tropeços que cometera, ganha a vida, alimenta e educa sua filha. Ele mesmo nada possui.
   Me perdendo assim a falar de mim mesmo na terceira pessoa, me faço rir. Mr. Mojo Rising, repetidas vezes ecoando pelo quarto. O que fará agora? Guardar a pequena caderneta na qual deposita suas palavras, cobrir-se com um fino lençol que não lhe incomode na pele, fechar os olhos. Adormecer e em sonhos distrair-se um pouco. Pela manhã mentir para si mesmo que os planos certos são estes, que todo o restante há de se acertar. Negar ainda mais um pouco a idéia de abandonar a futura escola de teatro para poder começar a ganhar algum dinheiro. Negar ainda mais a certeza de que dentro de menos de um trimestre terá que voltar à universidade, amargando já pelas futuras aulas que irá ministrar.
   Uma última olhada no relógio, outra no céu - para perceber que começa já a amanhecer. Guarda sua caderneta e apaga as luzes. Então, tudo lhe é alheio... E ainda não venceu seu medo da escuridão.
  

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