quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Conselhos

  A armadilha do tempo é traiçoeira. Nunca dei valor ao que me disseram os mais velhos, os enrugados e desistentes, aqueles que deixaram de lado seus sonhos para se segurar aqui e conseguir passar mais um dia sem chorar. Eu passei tempo demais acreditando em vidas plásticas que via na TV, a liberdade e a autoafirmação de Will, o dinheiro fácil e a promiscuidade de Charlie, os seis amigos perfeitos que nunca se separam. Achei que era tudo ficção e percebi que me deixei levar. Não me dei conta, mas passei a acreditar e desejar tudo aquilo que eu, avidamente, assistia acontecer, episódio por episódio. Me afundei em livros, em leituras, em escrever, imaginar, todas essas atividades boas para a alma e más para o bolso. Hoje me vejo no ponto em que deveria escolher meu futuro, o momento no qual eu deveria estar preparado e daí então, dar um passo.

  Não me preparei, não estudei o bastante, não conheci a burocracia tão bem quanto deveria. Tudo que tenho são quatrocentas e duas mil páginas de ficção, um coração frágil demais e uma falta de maturidade de dar medo. As minhas faculdades mentais desaceleraram, entraram no ritmo dos desejos e sonhos. Esses os quais ruíram e sepultaram minha felicidade. Contento-me com coisas poucas, tento ser pequeno e pensar menor ainda. Talvez um emprego, uma casa de quatro cômodos numa favela qualquer, eu realmente não me importo. Desde que eu possa levar comigo todas as minhas mentiras, todos os meus livros e o meu violão.

  Sempre fui dado às artes, sempre amei música e me deliciei com tudo que eu podia encontrar de melhor. Sempre excitei-me com histórias inventadas, vidas passadas que nunca existiram, narrações diretas, personagens planas, pequenas ilusões em tinta preta e papel branco. Jovens heróis modernos ou antigos amores impossíveis, todos esses, mentiram para mim.

 Se me fosse reservada a tarefa de dar um conselho à próxima geração, não teria dúvidas: Todos aqueles "dados à arte", se matem. O mundo não foi feito para vocês, as engrenagens não rodam para o seu favor. Tudo é pragmático e bruto. Deixem apenas os poucos e bons que conseguem conciliar sua estupidez pela arte, com sua regular vida mecânica. Não há esperança em sonhos feitos de papel e melodia. Tudo se move linearmente, sem vacilar. Não há espaço para uma vida diferente dessa. Desistam agora, por favor.

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